domingo, dezembro 3

SINA

Boas noites, Bernardo, lembras de mim? Sou aquela tua ex-aluna que por destino tambem se tornou ex-namorada. Tu me chamavas de "minha flor de ursinha", enquanto eu te chamava de "meu ursao", um daqueles apelidinhos dissonantes que todo casal tende a ter, por pieguice beirando o ridiculo. Do you remember, don't you? Mas quem ama nunca ve, im-pres-si-o-nan-te! E nem reconhecestes minha nova cara?! Ah, se fosse so' ela... Entao foi por isso. Meu interior e' lunar, ja' dissera. A fase atual e' cheia. Sim, estou. Farta como quem enche a barriga de comida pesada tentando arrotar e vem a provocar o vomito. Choco, vazio. Nao, nao se trata de enjoo de gravida, nem ando bulimica. Agradeco a preocupacao.

Como esta's? Hum, entao sumistes do mapa... Logo vi. Dificil mesmo fazer essa gente aborrescente gostar de Literatura, né? Mas me enveredo tambem por esta area. Decidi, se nao conseguir ensinar esse povo a fazer um "O" com uma quenga, persistir em me fartar de livros, sejam meus ou nao. Acertastes, continuo escrevendo... Quem comeca nao cessa, vicia, e' dom. Sabes, falastes isto para mim sentado naquele banco de praca, com as duas maos fofas postas sobre a bengala, feito cavalheiro dos anos 20. E olha que ainda temos vinte anos de diferenca entre as idades! Na e'poca, eu com dezesseis e tu podias me encaixar na casa dos 30 quando te escrevia longas cartas. Achas-me decre'pita agora que atingi a maioridade? 'As vezes me sinto uma velha ao caminhar ate a pharmacia a fim de comprar camisinhas e me pego rindo da Corega noutra prateleira. Sera' que prevejo algo? Jamais perdi essa mistica desde que te conheci. Deve fazer mais de cinco anos, contudo, guardo tua (a)feicao intacta, tal a correspondencia sem fim dentro de um bau'. Dali, emociono meu espirito ainda jovem ao resgatar um soneto intitulado Essa Que Eu Hei de Amar, do Guilherme de Almeida:
Essa que eu hei de amar perdidamente um dia,
Sera' tao loura, e clara, e vagarosa, e bela,
Que eu pensarei que e' o sol que vem, pela janela
Trazer luz e calor a esta alma escura e fria.

E, quando ela passar, tudo o que eu nao sentia
Da vida ha' de acordar no coracao, que vela...
E ela ir como o sol, e eu irei atras dela
Como sombra feliz... - Tudo isso eu me dizia,

Quando alguem me chamou. Olhei: um vulto louro,
E claro, e vagaroso, e belo, na luz de ouro
Do poente, me dizia adeus, como um sol triste...

E falou-me de longe: "Eu passei a teu lado,
Mas ias tao perdido em teu sonho dourado,
Meu pobre sonhador, que nem sequer me viste!"

E aconteceu... Da segunda vez, mais pareceu um Deja' Vu. Por isso, ja' vou em meu ocaso cheia a lua de vida. Foi bom reve-lo em devaneio sem ser revista. Hasta la vista, meu Buda ditoso e adeus ao paradoxo!

Um comentário:

Anônimo disse...

O homem que vive na indiferença, é aquele que ainda não viu a mulher que deve amar.

Autor: La Bruyère , Jean de