sábado, janeiro 20

Santo Espírito

Mais uma viagem não tão distante para assinalar no caderninho. Destino: Paraipaba, sob o signo de Praia da Lagoinha, uma das mais belas do Ceará e do mundo. Fretei um ônibus pela vez primeira com mamãe. Combinamos de rever uns terrenos nossos por lá e decidir se pôr à venda ou construir uma morada de finais de semana ou pousada. No início, pensei que morreria de tédio com minha querida genitora descrevendo a paisagem da janela, enquanto eu tentava extrair um cochilo por tanta carnaúba à nossa frente. Demora. A 100 km só. Parava tanto em freios poeirentos, entrava-saía tanta gente dos terminais que... Bom.

Enfim chegamos, umas duas horas e meia depois. Um velho amigo de mammy iria nos buscar em alguns minutos. Alívio! Encaramos mais um bocado de estrada ouvindo Beethoven e nos enveredamos pela área dos nossos lotes, perto de uma caixa d'água e de um cemitério. Enquanto os coroas se entretiam lendo uma planta em linguagem arquitetônica, observava as cruzinhas das lápides por cima do muro a contrastar com o céu de azul claríssimo. Daí fui convidada a dar uma volta pela orla marítima de Hilux e passar o dia em um sítio.

Larguei o marasmo e me diverti a valer. Haviam mais dois colegas senis mui simpáticos conosco, um deles tocava violão muito bem; levamos umas dos Beatles no gogó, todos cantaram outras canções antigas, conversamos sobre filmes e espiritualidade. Ele me prometeu emprestar "Minha Vida na Outra Vida", sobre a última encarnação de uma moça na Irlanda. Sincronicidades acontecem e muito, a mim ultimamente. Arrepios sensitivos da alma pelo corpo...
Há certo tempo não me sentia tão próxima do mundo astral em contato com a natureza verde literabstrata e encontrando a minha própria, serena e límpida. Ali vi vira-latinhas e cachorrões super dóceis a conviver com galinhas d'Angola, cabritos, pássaros, patos, faisões, harmoniosamente. Brinquei, voltei a ser menina, mergulhei meus pés de areia branca na lagoa em frente à varanda, almocei refeição saudável, frutos do mar, frutas diversas, água de coco, suco do pé de acerola dali e vinho madeira. Depois, tiramos a sesta em redes no alpendre da casa, conversamos sobre as coisas simples da vida, aprendi numa tarde coisas inúmeras, rindo à toa e calma, ouvindo passarinhos entoando God Spell.

Impressionei-me com a coleção de pombos-correio do grande amigo de mamãe e os troféus permeando as paredes da sua sala pelas competições mundo à fora de lançamento de pombo à distância - regresso. Arrevoadas acima de minha cabeça, divino espetáculo, sensação de PAZ.
No caminho de volta, mais emoções. Tive o encantamento de ter conhecido seres humanos de uma elevação tamanha, sentia-se pela firmeza nas palavras, no aperto de mão e no abraço inteiro doado. Descobri generosidade, união em família, caridade. LUZ, muita luz! Um passeio que me redescobriu como filha e como alguém dotada de talentos para cumprir uma missão nessa jornada terrestre. Vi gente com muito doando aos que mais necessitam, vi despreocupação com a velhice, vi confiança, vi o quanto minha mãe precisava desse contato. Percebi sua voz tremular num choro-sorriso amplo. Tudo ganhou novo ânimo. E eu sou grata pelo que me acontece a cada dia. Por bem, pois bem, tudo é aprendizado. Natural alegria. Evolução in constructa.

[Ouvindo: Björk - Oceania; Desired Constellation; Ancestors]

Nenhum comentário: