segunda-feira, setembro 28

(De)formada, enfim!


Santo Ambrósio me ensinou a colocar acima de qualquer estudo o estudo de nós mesmos. Não por ser cristã, mas adepta da aprendizagem alargada pela rua, experimentei melhor a vida ao ingressar na faculdade de Letras. Passei bem pelo vestíbulo do vestibular, olhei-me as entranhas no espelho, muito porém. Ali na universidade conheci peçonhentos seres, meti-me em confusões tamanhas, só que de tudo pude tirar proveito, prova e privacidade.

Moldei o pensamento através de livros, com embasamento e vazamento de verve nos escritos. Fiz parte de trocentas (ou troçentas ou mesmo traçentas) comunidades ditas literárias, perfurei egos aos gritos, emaranhei minha voz tímida entre pessoas esclarecidas, outras esclerosadas. Bom. Aprendi a beber no barzinho ao lado da UECE, a jogar cartas sobre o birô do professor, a parar de chegar tão cedo no turno da manhã, a observar mais. Já reprovei por falta, já mudei para o horário da tarde e, por fim, ganhei a noite do mundo.

Tive a alegria nada hipócrita de passar por greves, perder ganhando semestres inteiros longe das carteiras escolares, sentada nos bancos de praça lendo ou cinemando, enfurnada em teatro. Conheci Almodóvar, amigos gays interessantíssimos os quais cultivo até hoje, fanzines, música, poesia. Fiquei careca na época do coral, quebrei o pé a caminho da aula, exibi o gesso desenhado. Saudades dos bilhetinhos trocados no fundo da classe, dos mestres gagos, dos personagens todos, das conversas etéreas com crise de riso. Tantos momentos, também, em que me senti desmotivada, sem ânsias por lecionar normas. Na beira da praia tentei morrer, minha índole não permitiu, contudo. Prossegui com preguiça, procrastinada mais que obstinada, e consegui sobreviver. Agora ficam me perguntando meus planos, enquanto acho tudo sensacional. O que vier, será, ué. Grata sou aos meus genitores pela boa educação, incentivo, ingrata sou ante as pressões e depressões por que passei, mais nada.

Nota 10 na monografia sobre uma Hilda Hilst escandalosa, fugidia dos acentos acadêmicos tal como eu, tal como meu tal e qual sem tanta regra, só trégua (por enquanto) é o que almejo. Com licença que vou ler o jornal na varanda, passar um tempo sem pensar no sustento que meu mérito dar-me-á no futuro. Há de dar (certo). Sempre dá.

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